Lisboa, dia 16 de Maio de 2018
Exmo. Senhor/a Deputado/a
Assembleia da República Portuguesa
Senhor/a Deputado/a,
Chamo-me António Vieira da Cruz,
sou portador do cartão do cidadão (--------) e voto em Lisboa. Não tenho o
costume de escrever aos senhores deputados que representam o círculo eleitoral
onde vivo e trabalho, mas faço-o agora por saber que a Assembleia da República
irá debater e votar nos próximos dias uma questão de vida ou de morte: a
eutanásia.
Já vivi em países onde a eutanásia está legalizada,
como a Bélgica ou o Canadá, mas V.Exa. estará certamente a par do impacto desta
práctica nesses países e dos números que confirmam o cenário da slippery slope, a tal “rampa deslizante”
que vai afectando cada vez mais vidas dos nossos. Para ilustrar este fenómeno, por
exemplo, a Bélgica viu um aumento de 769% de eutanaziados em apenas 10 anos
(2003-2013). Vejo o Canadá caminhar na mesma direcção e os números relativos a
países como a Holanda, o Luxemburgo e a Suíça são igualmente esclarecedores.
Devemos compreender a dor e o sofrimento dos
doentes e idosos, que estão entre os mais vulneráveis da nossa comunidade. A dor
e o sofrimento são realidades ligadas, que por vezes se sobrepõem, e é certo
que a dor pode despertar sofrimentos e que o sofrimento pode manifestar-se na
forma física de dor. No entanto, vejo utilidade em distinguir a dor física de
uma doença ou acidente, do sofrimento íntimo de quem perdeu um ente querido ou
teve uma desilusão, ou de quem se sente mais só e vulnerável. A eutanásia pode
parecer a alguns uma espécie de golpe de misericórdia que acaba com a dor de
quem sofre, mas essa visão está errada, profundamente errada.
A eutanásia não é uma solução para a dor e para o
sofrimento de um paciente, mas uma resposta que baralha ambos os conceitos e
simplesmente tira a vida daquela pessoa, desistindo dela e aumentando o
sofrimento a quem cá fica. Bem sei que uma lei é geral e abstracta, mas peço a
V.Exa. que por favor tenha em mente aqueles casos que conhece pessoalmente ou
com os quais já se deparou. Aquela pessoa em concreto, com nome e cara, com
toda uma história de vida, merece o quê de nós? Apoio ou desistência? Alívio ou
peso? Esperança ou derrotismo?
Um regresso ao passado? |
Situações complexas, como estas, merecem de nós uma
reflexão profunda que não é compatível com a resposta simplista da eutanásia. Eu
não tenho dúvidas que a resposta que devemos dar a todos os níveis (legal, social,
pessoal) tem de ser clara: toda a vida tem dignidade, aliviemos a dor e
combatamos o sofrimento com a comprovada eficácia dos cuidados paliativos e o acompanhamento
humano a quem mais precisa de nós.
Sinceramente, eu não sei se o Estado é hoje uma
entidade de bem. Mas sei que o devia ser. Sejamos!
Agradece a atenção de V.Exa. e envia os melhores
cumprimentos,
António Vieira da Cruz, Português, 32 anos.
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