Eutanásia - carta a todos os deputados

Lisboa, dia 22 de Maio de 2018

Exmo. Senhor Deputado [NOME]
Assembleia da República Portuguesa


Senhor Deputado [NOME],

Chamo-me António Vieira da Cruz, sou portador do cartão do cidadão [--------] e voto em Lisboa. Escrevo porque sei que a Assembleia da República irá debater e votar nos próximos dias uma proposta de legalização da eutanásia.

Edvard Munch - A dança da vida (1899)

Já vivi em países onde a eutanásia está legalizada, como a Bélgica ou o Canadá, mas V.Exa. estará certamente a par do impacto desta práctica nesses países e dos números que confirmam o cenário da slippery slope, a tal “rampa deslizante” que vai afectando cada vez mais vidas. Para ilustrar este fenómeno, por exemplo, a Bélgica viu um aumento de 769% de eutanaziados nos primeiros 10 anos completos (2003-2013) depois da entrada da lei em vigor no ano de 2002. Na Holanda os casos de eutanásia têm aumentado cerca de 10% cada ano, com 6091 eutanásias em 2016 a representar mais de 4% das causas totais de morte nesse país. Vejo o Canadá caminhar na mesma direcção e os números relativos ao Luxemburgo e à Suíça são igualmente preocupantes.

Para além de uma cuidada análise dos números e daquilo que estes representam, esta questão exige de nós uma abordagem humana e socialmente responsável. Por isso é que eu, sendo parte de uma sociedade civil que também é chamada a reflectir sobre a eutanásia, convido V.Exa. a comigo pôr-se na pele:

- do Doente, que está frágil e vulnerável, com dores e em sofrimento, mas intacto em dignidade humana;
- da Família e outros Cuidadores, que acompanham o Doente naquele momento de grande fragilidade e vulnerabilidade, dando-lhe ânimo, paz e esperança para combater o sofrimento;
- do Médico, em quem o Doente confia para ser tratado, das dores aliviado e - se possível - curado;
- do Estado, que tem o dever de acudir pelo menos aos mais fragilizados da sociedade, dando um enquadramento legal que os protege e, se chamado, agindo como entidade de Bem;
- do Legislador, que legisla tendo em conta o Bem Comum.

Senhor Deputado, neste caso, o Bem Comum é realmente coincidente: o bem do Doente, da Família e outros Cuidadores, do Médico e do Estado é a protecção da vida humana. A hipótese da eutanásia destrói a relação de confiança entre o Doente e o seu Médico. A hipótese da eutanásia acrescenta ao Doente sofrimento e o peso da dúvida na altura em que está mais vulnerável. Se efectuada, a eutanásia não elimina o sofrimento, elimina sim uma vida e aumenta ainda mais o sofrimento de quem cá fica. A eutanásia é uma desistência de tratar, cuidar, acompanhar. E no entanto, os cuidados paliativos nunca foram tão eficazes e avançados como são hoje.

Infelizmente, nos últimos anos o Estado tem-nos falhado em várias áreas. Mas o Estado é feito de pessoas e errar é humano. O que não posso conceber é que o Estado se demita deliberadamente de uma obrigação fundamental sua, a de zelar pelo Bem Comum e a protecção legal dos mais fracos.

Espero de V.Exa. que legisle em prol do Bem Comum.

Obrigado pela atenção e os melhores cumprimentos,
António Vieira da Cruz, Português, 32 anos.

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